
Osasco, calçadão central. Quem passa por lá inevitavelmente cruza com um carrinho de hot dog diferente: é rosa, vibrante, cheio de balões em datas especiais e, mais importante, carrega uma história que vai muito além do lanche. Esse é o Hot Dog Pantera, comandado pelo carismático Fábio de Jesus, de 42 anos, e seu braço direito e amigo Valdiran, um migrante maranhense que, como Fábio, trouxe na bagagem muito mais que sonhos — trouxe coragem, dignidade e afeto.
Uma vida de recomeços
A trajetória de Fábio é marcada por desafios que, para muita gente, seriam impossíveis de superar. Rejeitado pela família, viveu de favor na casa de amigos, enfrentou dependência química, foi diagnosticado duas vezes com meningite e, em 2014, precisou passar por uma cirurgia de emergência para retirar o apêndice que quase estourou.
Entre empregos de faxineiro e tentativas de estudo em enfermagem e Direito, Fábio também encarou o luto: perdeu o pai durante a pandemia de Covid-19. “Um ser que não me criou, mas nunca me maltratou por eu ser gay”, conta. A dor o levou à depressão, ao desemprego e, mais uma vez, a recomeçar do zero.
Foi aí que surgiu a ideia do carrinho de hot dog. E não um carrinho qualquer: um carrinho rosa, no calçadão mais movimentado de Osasco. “Imagina: um gay, depressivo, com um carrinho cor-de-rosa no meio do calçadão. A vergonha e o medo batiam, mas eu precisava sobreviver. E Deus me abençoou.”
O Hot Dog Pantera
A ousadia deu certo. O Hot Dog Pantera nasceu como um pequeno carrinho comprado parcelado em 16 vezes. De lá pra cá, só cresceu. Hoje, Fábio já quitou seu novo carrinho, avaliado em R$ 23 mil, se tornou referência na cidade, conquistou o 2º lugar no prêmio de Melhor Hot Dog de Osasco, foi destaque na Globo, no SBT e na Assembleia Legislativa de São Paulo.
Mas Fábio faz questão de dizer: o maior orgulho não são os prêmios, mas o respeito conquistado. “Quebrei um pouco do preconceito. Os maiores clientes são héteros e amam nosso lanche. Isso é lindo! Do fundo do poço ao orgulho de ser quem eu sou.”

Valdiran: do Maranhão para Osasco, com orgulho
Ao lado de Fábio está Valdiran, seu melhor amigo e parceiro de trabalho. Migrante do Maranhão, chegou em São Paulo há dois anos, carregando esperança, sonhos e o medo de não ser aceito. Mas encontrou em Fábio não só um amigo, mas um irmão.
“Cada dia é um recomeço. Cada cliente é uma nova história. E cada hot dog que a gente serve é feito com amor. Mesmo longe de casa, eu descobri que posso construir um lar onde houver afeto, luta e identidade”, diz Valdiran.
Muito além do lanche
O carrinho rosa virou um símbolo de resistência LGBTQIAPN+ em Osasco. No mês do Orgulho, Fábio faz questão de se expressar: “Sou feliz por ser gay, por viver minha verdade e fazer parte de tantas histórias de superação. Somos vitoriosos.”
E pra quem acha que comida de rua não tem política, o Hot Dog Pantera é a prova de que cada espaço público ocupado por corpos dissidentes, cada venda, cada sorriso e cada cliente fiel ajudam a romper o preconceito e construir pertencimento.
