
Você já ouviu falar do termo verde lésbico?
Talvez tenha esbarrado com o termo em uma conversa online, em post de meme ou até no contexto das bandeiras da diversidade. Mas o que exatamente ele representa e por que tantas lésbicas o reivindicam com tanto orgulho?
Neste artigo, a gente vai entender de onde vem esse verde, o que ele significa historicamente e culturalmente e por que é importante falar sobre isso com seriedade, afeto e um tantinho de deboche (como boas militantes sapatonas que sou).
O que é Verde Lésbico: A Estética do Afeto, da Identificação e da Resistência
A expressão surgiu de forma espontânea, especialmente em plataformas como TikTok e Twitter, quando usuárias passaram a comentar sobre a recorrente preferência de lésbicas por tons de verde mais fechados, em especial o verde oliva.
Roupas, acessórios, esmaltes, objetos de decoração: tudo parecia apontar para uma estética comum entre mulheres lésbicas que até então nem sabiam dividirem esse traço em comum. E foi justamente essa coincidência divertida que despertou o senso de pertencimento e viralizou a expressão verde lésbico.
Com o tempo, o termo deixou de ser apenas uma tendência passageira e passou a representar algo mais profundo: o gosto compartilhado como forma de identificação coletiva. Muitas mulheres começaram a se enxergar na estética sugerida, reconhecendo em si mesmas esse afeto por tons mais sóbrios, terrosos e orgânicos.
A sensação de “isso é muito sapatão” virou um código visual, uma linguagem silenciosa que conecta mulheres em diferentes contextos.
A força da tendência foi tanta que até marcas comerciais passaram a prestar atenção. Empresas como Suvinil, no setor de tintas, e Risqué, no de esmaltes, apostaram em campanhas e produtos inspirados nessa paleta de cores, aproveitando o burburinho das redes para se aproximar de um público que, historicamente, sempre foi marginalizado pelo marketing tradicional.
Essa apropriação comercial também gerou debates na comunidade sobre pinkwashing, mas isso é pauta para outro momento.
O verde lésbico não vem sozinho. Ele integra o que muita gente já chama de “paleta lésbica”, que inclui também outras cores como terracota, mostarda, bege e variações de tons mais naturais e pouco saturados.
Essa estética terrosa e acolhedora contrasta com outras expressões mais vibrantes da cultura queer e ajuda a reforçar a diversidade dentro da própria sigla LGBTQIAP+. Cada cor carrega sua política, cada escolha estética pode ser um gesto de resistência.
No fim das contas, o verde lésbico é sobre isso: não apenas uma cor, mas uma sensação de se ver refletida no mundo. É o riso de canto de boca ao encontrar uma desconhecida usando uma jaqueta verde oliva e pensar “sapatão”. É a estética que abraça, que comunica, que aproxima. E que, mesmo sem ser oficial, já virou bandeira.
O Uso Simbólico e de Militância do Verde Lésbico
Além de ser uma tendência estética observada nas redes sociais, o verde lésbico pode ser compreendido como parte de um fenômeno mais amplo chamado de “estética identitária”. Esse conceito envolve como grupos marginalizados constroem símbolos visuais próprios para se reconhecer e se comunicar dentro e fora da comunidade.
A cor, nesse caso, funciona como um marcador cultural e emocional. É como se o verde oliva dissesse, silenciosamente, “sou como você”.
O tom escolhido, mais escuro, opaco e ligado à natureza, também foge do padrão hipersexualizado e colorido que por muito tempo tentou definir o que era ser uma mulher queer.
Em vez de brilhar, o verde lésbico aconchega. Em vez de chamar atenção para fora, ele acolhe para dentro. Isso conecta com a maneira como muitas lésbicas se posicionam no mundo, especialmente as mais politizadas, que rejeitam rótulos impostos e constroem seus próprios códigos.
Existe também uma leitura sobre como o verde lésbico conversa com outras identidades no espectro sáfico. O uso de cores neutras, naturais e discretas, por exemplo, é comum entre mulheres não femininas, andróginas ou queers que não se identificam com padrões de feminilidade cis-heteronormativos.
O verde oliva, nesse contexto, ajuda a romper com a ideia de que mulher lésbica precisa performar feminilidade para ser validada socialmente.
Outro ponto relevante é que o verde lésbico ganhou força num momento em que a estética dos memes e das microtendências se tornou uma nova forma de construção política. O humor e a ironia funcionam como estratégia de sobrevivência na cultura lésbica. Rir de si mesma, transformar pequenos hábitos em identidades estéticas, se apropriar de estereótipos para reinventá-los, tudo isso compõe uma narrativa onde o verde também é linguagem.
Há quem diga que o verde lésbico é uma espécie de uniforme não oficial. Mas, na prática, ele é o oposto disso. Ele é um símbolo não normativo, que não foi imposto por ninguém, mas sim criado de forma espontânea, por sapatonas que se observam, se identificam e se abraçam por meio de pequenos detalhes.
Não nasceu de uma bandeira, de uma marcha ou de um manifesto. Nasceu do cotidiano. E é justamente por isso que é tão potente.
O uso da cor também aparece em fanarts, na personalização de capas de livros, na decoração de ambientes, na escolha de esmaltes e até nas sugestões de tatuagens compartilhadas entre lésbicas nas redes. E embora não seja um símbolo institucionalizado, ele já funciona como um emblema coletivo, uma forma de criar comunidade a partir da estética.
No fim das contas, se você olhar para o seu armário e perceber que metade das suas roupas são em tons de verde musgo, se seu esmalte preferido se chama algo tipo “folhagem urbana” e se você já sentiu uma inexplicável atração por uma mulher de jaqueta verde oliva… sinto informar: você pode estar sendo afetada pelo vírus do verde lésbico.
Não tem cura, mas também, quem é que quer ser curada? Se é para pertencer a alguma estética, que seja essa que mistura natureza, sapatice e resistência com um toque de bom gosto.