
No dia 20 de maio de 2025, a Comunidade dos Jerônimos de Passos conquistou uma vitória histórica: o reconhecimento oficial como Comunidade Remanescente de Quilombo, um marco que reforça a resistência, a ancestralidade e os direitos desse povo que há gerações mantém viva sua cultura e história no município de Passos, Minas Gerais.
“Esse reconhecimento significa a valorização da nossa ancestralidade, das nossas raízes negras e africanas, da nossa história enquanto família e grupo que resiste de diversas formas há décadas no município”
Afirma Simone Aparecida de Souza, neta de Jerônimo dos Santos, fundador da comunidade. Simone é mãe de santo do terreiro de umbanda da comunidade, babalorixá e coordenadora geral do Terno de Congo Irmandade do Menino Jesus, uma das expressões culturais e religiosas que mantêm viva a tradição dos Jerônimos.
A Luta pelo Reconhecimento

A trajetória até essa conquista foi marcada por desafios, reflexões e, acima de tudo, união. “Essa conquista começou com o entendimento coletivo de que nossa história era quilombola. Fomos compreendendo e reconhecendo isso com o auxílio da Federação das Comunidades Quilombolas de Minas Gerais, N’Golo, e da nossa amiga e parceira Eliane Baltazar, que está elaborando uma dissertação de mestrado sobre o tema na UEMG”, explica Simone.
Eliane Baltazar da Costa, quilombola da Irmandade do Rosário de Justinópolis e congadeira, celebra a conquista como resultado de uma caminhada coletiva. Ela é estudante do mestrado em Desenvolvimento Regional e Meio Ambiente (PPGDRMA) pela UEMG, onde desenvolveu uma pesquisa sobre a identificação, registro e certificação da Comunidade Quilombola dos Jerônimos, viabilizada por meio de bolsa do ProBPG-UEMG. Para ela, essa conquista representa não só a conclusão de sua pesquisa, mas também a realização de uma missão construída há anos junto às comunidades quilombolas de Minas Gerais.
Para Eliane, a importância da ancestralidade no cotidiano do quilombo é central. “A partilha de saberes nos quilombos é por meio da tradição oral com os ensinamentos deixados pelos nossos antepassados, esta memória é toda a base de sustentação de nossa continuidade. A perpetuação de nossa cultura está ancorada na memória de nossos ancestrais.”
A defesa de sua dissertação de mestrado, prevista para junho de 2025, servirá como mais uma ferramenta de fortalecimento da comunidade. Eliane ainda reforça o chamado para que pesquisadores de diferentes áreas somem-se ao quilombo, contribuindo com estudos que registrem e valorizem os diversos saberes presentes na comunidade dos Jerônimos.
Cultura, Memória e Ancestralidade
O Quilombo dos Jerônimos carrega em seu cotidiano práticas e saberes ancestrais que moldam sua identidade. “Nosso território é sagrado. As rezas, nossas plantas, os costumes e o próprio cotidiano são fundamentais para nossa existência. Valorizamos muito tudo que nos foi ensinado pelos nossos antepassados e por nossa religiosidade afro-brasileira”, destaca Simone.
No caminho até essa conquista, a comunidade também precisou lidar com momentos de dor e resistência. A morte de Jerônimo dos Santos, fundador da comunidade e avô de Simone, foi um dos episódios mais difíceis. “Sua morte foi um dos momentos mais difíceis e desafiadores. Tivemos que nos reestruturar a partir de sua ausência física e entendermos que sua memória é viva e que ele sempre estará presente”, relata Simone.
A memória dos que vieram antes segue sendo a base da vida no quilombo. “Eles nos ensinaram os costumes que fundamentam nosso reconhecimento como quilombolas. As comidas, o uso das folhas, os benzimentos, as orações, nossas ervas, festas e comemorações… tudo isso vem deles.”

Foto: Arquivo pessoal – Jerônimo Santos, fundador da comunidade.
Os Próximos Passos da Comunidade
Agora, com o reconhecimento oficial, a luta continua. A comunidade planeja dar início ao processo de retomada do território que historicamente lhe pertence. “Nesse momento, iniciamos uma nova fase no processo de reconhecimento quilombola. Queremos pleitear, junto ao Incra, o território que nos pertence e que não está em nossa posse. É fundamental que esse território seja retomado, porque estamos espremidos, sem possibilidade de realizarmos várias de nossas práticas. Desejamos ampliar o espaço de recepção dos outros grupos de congado que recebemos, ter uma sede própria para nossa Irmandade, uma nova capela e reconstruirmos nossa relação com a mina d’água que nos foi retirada e que tem grande importância para nossa família, onde meu avô tinha uma horta, a qual poderia ser refeita.”
Paralelamente, junto à liderança de Eliane Baltazar, estão sendo traçadas estratégias para fortalecer a educação no quilombo, com foco na implementação de projetos de educação antirracista, além da organização fundiária por meio do RTID (Relatório Técnico de Identificação e Delimitação) junto ao INCRA, etapa fundamental no processo de regularização do território quilombola.
Como Apoiar
Para quem deseja conhecer mais sobre a história e fortalecer essa luta, a comunidade mantém suas redes sociais ativas, onde divulga suas atividades e eventos culturais. “Estamos de braços abertos para quem quiser conhecer e divulgar nossa história. É por meio do fortalecimento coletivo que seguimos firmes”, convida Simone.
O perfil no Instagram é @irmandadedomeninojesus e @quilombodosjeronimos






