
Por Patrícia B. Zupo
Quem passou por Curitiba nesta última semana de março pôde prestigiar grandes talentos nos palcos dos teatros, praças, bares e ruas da cidade. É possível até encontrar com famosos caminhando pelos parques ou degustando alguma iguaria local em restaurantes. Cenas nada comum para os curitibanos, mas que gera e movimenta o cenário artístico, desperta interesse no público e forma plateia de grupos locais que levam a arte da encenação para todo canto da capital paranaense.
Assim como a arte imita a vida, é possível encontrar diferentes gêneros da dramaturgia trazendo temas de reflexões para a sociedade e gerando até mesmo debates a partir do que acontece ali nos palcos de teatro. É caso por exemplo do que a atriz Débora Falabella proporcionou ao público que lotou o Teatro Guaíra nos dias 25 e 26 com a peça Prima Facie. Pelo espetáculo, a atriz já venceu o Prêmio Shell e Prêmio APCA (Associação Paulista de Críticos de Arte) de Melhor Atriz de Teatro em 2024 e também recebeu o Prêmio Arcanjo de Melhor Solo. Prima Facie também foi indicado ao Prêmio Shell de Teatro em outras duas categorias: Direção e Música.

Débora vive a personagem Tessa, advogada bem sucedida que tem como clientes acusados de crimes sexuais. O histórico de Tessa é conhecido por inúmeras mulheres: família pobre que tem a mãe como ponto central de apoio e questões para lidar, como a dependência química do irmão que, na maioria das vezes, é violento dentro de casa. O ápice deste solo é quando a personagem precisa lidar com um acontecimento que muda sua própria vida ao ser vítima de estupro. O fato a obriga rever uma série de valores e princípios, além de apresentar ao público uma reflexão sobre o sistema judicial, a condição feminina e as relações que envolvem diversas esferas de poder.
Escrito por Suzie Miller e apresentado pela primeira vez em Londres em 2022, o texto teve dezenas de montagens ao redor do mundo. No Brasil, a estreia foi em abril de 2024, no Rio de Janeiro, sob a direção de Yara de Novaes.
A autora do texto já foi convidada a debater o tema “abuso de mulheres” na última assembleia da ONU. Em agosto de 2024, a peça foi apresentada em Brasília, onde recebeu a ministra do STF Carmen Lúcia, o ex-ministro Ayres Britto e a subprocuradora geral da República, Raquel Dodge. No encontro, foram abordados temas importantes, como a representatividade feminina no judiciário e a legislação de violência sexual.
Débora Falabella disse, em entrevista, que se sente muito honrada em poder utilizar de seu ofício como poder de transformação: “Desde a nossa estreia, sempre me impressiona como muitos homens estão na plateia. Alguns vão acompanhados das esposas, e saem completamente mudos, porque alguma coisa pegou ali. É muito bonito poder falar pra todo mundo”. E completa que “alguma coisa precisa mudar.” Frase (provocativa) da qual faz uso em seu último ato no monólogo.

Plastic Doll
O tema também se faz presente na Mostra “Plastic Doll” que realiza sua primeira apresentação em festivais, integrando o Fringe 2025 na programação do Festival de Curitiba. Plastic Doll é uma peça teatral performática que se utiliza de várias plataformas. O público emerge em uma casa de dois andares disposta para a encenação dos atores. Neste ambiente encontram-se objetos de decoração do dia a dia e itens de luxo. A iluminação ora é ambiente com luz branca, ora púrpura com luzes avermelhadas e pink. As cenas acontecem simultaneamente e em todos os cômodos da casa, como se estivéssemos emergidos em um reality show.
O projeto investiga construções de gênero e raça a partir da icônica boneca Barbie, que é apresentada em diferentes corpos e vivências sociais. Fotografias, vídeos, transmissão ao vivo pelas redes sociais, são peças utilizadas nas instalações da casa. Os atores em algum momento convidam todos a entrarem na sala de estar para ali, então, contracenam entre si, trocando temperamentos e atitudes, ainda como “bonecas perfeitas” que foram, assim, moldadas socialmente.
Desconstruir sistemas opressivos que levam a várias formas de violência: verbal, física, sexual, a todos os gêneros é a proposta do projeto. Em parceria com a Universidade Federal do Paraná para os diálogos sobre direitos humanos e com o Projeto Teatral Babel que humaniza, através da arte, a socialização de imigrantes nos Estados Unidos, a diretora artística do projeto, Ana Candida Carneiro têm levado o tema da violência doméstica para roda de discussões acadêmicas e realizado oficinas artísticas comunitárias abertas ao público.

Plastic Doll é composta pelos artistas convidados locais Carla Sanntes, Mazé Portugal, Rubia Romani, Stéfani Belo e Marwem HD – Interpretando Barbie/Ken, além da atriz surda Catharine Moreira como Pet da Barbie.
A Mostra Plastic Doll faz parte do Fringe 2025 e está na programação da 33ª edição do Festival de Curitiba que teve início no último dia 24 e se encerra em 06 de abril. O evento reúne cerca de 350 atrações espalhadas por mais de 70 espaços de Curitiba e região. Diversos gêneros como dança, circo, música, humor, performances e gastronomia, compõem a diversidade das manifestações artísticas.
Acompanhe todas as novidades e informações pelo site do Festival de Curitiba www.festivaldecuritiba.com.br, pelas redes sociais disponíveis no Facebook @fest.curitiba, pelo Instagram @festivaldecuritiba e pelo Twitter @Fest_curitiba.
No Paraná, projetos de acolhimento para pessoas vítimas de violência de gênero como AmarElas e Ampara estão disponível, saiba mais sobre as medidas voltadas ao atendimento às mulheres nesta reportagem.