Nos últimos meses, um nome tem circulado nas redes e em pautas ligadas ao debate sobre diversidade sexual: Mariele Gomes. Mas atenção — não confunda com a vereadora e ativista carioca Marielle Franco, assassinada em 2018 e símbolo mundial da luta pelos direitos humanos.
Mariele Gomes, com “G”, desponta agora em outro cenário — o da Aliança LGB Brasil, grupo que se apresenta como a representação nacional da LGB International, organização internacional que se define como defensora dos direitos de lésbicas, gays e bissexuais, sem incluir as pautas de pessoas trans e não binárias.
Um nome novo em um velho debate
Mariele Gomes é citada como uma das diretoras da Aliança LGB Brasil, e tem sido uma das vozes que defendem a separação entre orientação sexual e identidade de gênero — uma discussão que reacende a polêmica do movimento “LGB sem T”.
Em entrevistas e publicações, Mariele repete argumentos de que a junção das pautas teria “apagado” o que é ser mulher e prejudicado políticas específicas para lésbicas e gays. O discurso ecoa o posicionamento da LGB Alliance, grupo britânico que há anos divide opiniões dentro da própria comunidade LGBTQIA+.
A tal aliança internacional

A versão brasileira afirma ser parte de uma rede internacional presente em 18 países, batizada de LGB International. Mas, até agora, nenhum documento oficial ou lista de países signatários foi divulgado publicamente.
Também não há registro de CNPJ, estatuto ou diretoria oficial da Aliança LGB Brasil em bases públicas. O que se sabe vem de declarações e perfis digitais do grupo — e de falas de suas representantes.
Choque com o movimento LGBT brasileiro
Enquanto isso, o movimento LGBT tradicional no Brasil vê com preocupação o avanço desse tipo de discurso. Entidades históricas como a ABGLT e a Aliança Nacional LGBTI+ classificam a tentativa de separar as letras como um retrocesso e uma ameaça à unidade da luta.
Em notas públicas, coletivos têm reforçado que a força da sigla está justamente na pluralidade: “Não existe LGB sem o T. Nossas lutas são interligadas, nossas vidas também.”
Para as lideranças trans e travestis, o que se apresenta como “divergência conceitual” é, na verdade, uma ofensiva política travestida de neutralidade científica, que tenta deslegitimar identidades de gênero em nome de uma falsa proteção às mulheres cis.
Franco, Gomes e o uso simbólico dos nomes

O nome “Mariele” — quase idêntico ao de Marielle Franco — acabou gerando confusão e, em alguns casos, sendo usado nas redes para plantar desinformação. Há quem veja nisso uma estratégia simbólica: ocupar o espaço de um nome carregado de representatividade política para defender pautas opostas àquelas que Marielle Franco personificava.
Enquanto Marielle Franco lutava por uma sociedade mais justa, diversa e plural, Mariele Gomes defende um projeto de segmentação dentro da própria comunidade LGBTQIA+. São duas “Marieles”, mas com caminhos que caminham em sentidos contrários: uma pela união das minorias, a outra pela fragmentação da sigla.
Um espelho das tensões atuais

O surgimento da Aliança LGB Brasil é um reflexo de um momento de reconfiguração das disputas internas do movimento LGBT. De um lado, uma geração de ativistas que defende a indivisibilidade entre orientação sexual e identidade de gênero; de outro, vozes que buscam resgatar fronteiras rígidas e conceitos biológicos.
No meio disso tudo, o nome Mariele Gomes surge como símbolo de uma nova contradição: a de um movimento que, em nome da diversidade, precisa aprender a lidar com a diferença — até quando ela vem de dentro.
Reflexão
A história de Mariele Gomes ainda está sendo escrita — e cabe ao jornalismo fazer o que a militância muitas vezes não pode: perguntar, checar, confrontar e contextualizar.
Por enquanto, o que se sabe é que não se trata de Marielle Franco — nem de sua herança política.
Mas sim de um projeto que, sob o mesmo nome, tenta construir um caminho bem diferente daquele que a vereadora carioca sonhou: o de um Brasil onde as letras da nossa sigla se somam, e não se separam.
