
Nem toda ausência envolve, necessariamente, um ato natural como a morte física. Às vezes, o luto vem silencioso, em forma de fim: o término de um relacionamento, a separação de ideias que antes caminhavam juntas, ou a distância física entre corpos que já foram abrigo um do outro. A chamada morte afetiva — e não se sabe ao certo qual peso é maior: a morte física ou o luto afetivo, pois ambos se baseiam no fim e na dor. Lutar diariamente quando algo morre dentro de nós é perturbador, e manter-se em movimento só é possível, muitas vezes, com o apoio da rede de amigos, familiares e afins.
Lidar com essa ruptura vai além de superar uma ausência. Envolve um processo de reconstrução interna, onde a memória afetiva desempenha um papel delicado. E, diga-se de passagem, não existe tempo ou hora pré-determinada para a cura.
Quem nunca foi transportado de volta no tempo ao sentir um perfume conhecido ou ao passar por um lugar carregado de lembranças? Esses gatilhos são famosos: podem tanto confortar quanto reabrir feridas.
Mas até que ponto devemos evitar esses lugares, essas músicas, esses cheiros?
E até quando é saudável revisitá-los, na tentativa de ressignificar o que foi vivido?
Especialistas afirmam: não existe uma receita universal. Cada pessoa tem seu tempo e sua forma de elaborar a perda e descobrir de que maneira consegue lidar com ela.
Qual seria a fuga mais saudável ou menos dolorosa? Um apagão? Uma saída para conversar? Ou talvez o refúgio silencioso no quarto, abraçado ao travesseiro?
No entanto, permanecer eternamente refém da fuga pode impedir que a ferida cicatrize de forma real.
Voltar ao mesmo lugar — quando feito com preparo emocional — pode ser um ato de coragem. Não para reviver o passado, mas para afirmar que é possível ocupar aquele espaço com novas memórias, sem que as antigas se tornem prisão.
Acredita-se que o tempo e uma nova rotina sejam grandes aliados, paralelamente ao tratamento terapêutico, para amenizar os danos e atravessar o luto afetivo.
E a pergunta que precisa ser feita é: quanto vale a nossa saúde mental?
Vale, talvez, mais do que a insistência em reviver o que já não existe, mais do que tentar mais uma vez.
Vale escolher conscientemente, pesar na balança entre evitar e enfrentar, sempre com o cuidado de preservar aquilo que nos mantém inteiros.
Cuidar da mente é, muitas vezes, dar adeus ao que não cabe mais — afetivamente e fisicamente.
É abrir espaço para o novo, mesmo que isso signifique, primeiro, aceitar a dor da separação e da morte afetiva.
Só assim é possível seguir adiante, mais leve e mais forte, para dar continuidade à vida e manter-se vivo com as lembranças daquilo que foi vivido e celebrado.