Escola vencedora de grupo de acesso do Carnaval de SP teve enredo baseado em livro de pesquisadora da USP – Jornal da USP

Pérola Negra foi campeã do Grupo de Acesso 2 apresentando a narrativa “Exu-Mulher”, que traduz para o samba os principais achados de pesquisa relatados em obra premiada

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Cláudia Alexandre é uma mulher negra, veste um vestido longo e um enfeite de flores no cabelo cacheado. Ela está sobre a plataforma de um carro alegórico, junto a uma alegoria que representa o busto de uma representação feminina de Exu
Autora de livro premiado desfilou pela Pérola Negra junto a carro alegórico com representações femininas de Exu – Foto: Sheila Leoneli/Cedida pela pesquisadora Cláudia Alexandre

 

No domingo de pré-Carnaval, 23 de fevereiro, a escola de samba Pérola Negra venceu o Grupo de Acesso 2 do Carnaval de São Paulo com o enredo Exu-Mulher. A narrativa contada pelo desfile foi baseada no livro da jornalista Cláudia Alexandre, pós-doutoranda em Antropologia na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP. 

O livro Exu-Mulher e o matriarcado nagô: masculinização, demonização e tensões de gênero na formação dos candomblés é resultado da tese de doutorado de Cláudia, desenvolvida pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). A obra, que foi vencedora do Prêmio Jabuti Acadêmico 2024, descreve o processo de masculinização e demonização que a figura do orixá Exu sofreu na travessia atlântica da África ao Brasil.

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Cláudia trabalhou durante muitos anos na cobertura jornalística do Carnaval e elogia o trabalho realizado pelo carnavalesco Rodrigo Meiners em adaptar os principais pontos da pesquisa para a linguagem do samba: “Quando ele me apresentou a sinopse, eu me surpreendi com a sensibilidade com que ele leu as 460 páginas e conseguiu resumir os achados principais à pesquisa em um enredo de 50 minutos”.

Ela destaca como ponto forte do desfile a dramatização da comissão de frente, que apresenta ao público a história que será contada na avenida. Na encenação, Olodumare, grande senhor da criação, cria o elemento Exu, representado pelo par masculino e feminino. Em determinado momento, o Panteão dos Orixás se reúne em torno desse elemento central, mas Exu-Mulher é excluída. Exu reclama sua outra parte a Olodumare, mas segue sozinho com os orixás. Quando ela retorna, eles voltam a representar Exu em par. 

A Pérola Negra é uma das diversas escolas de samba que em 2025 levam para a avenida enredos com referências à cultura e às religiões de matriz africana. No grupo especial do Carnaval do Rio de Janeiro, nove das 12 escolas que desfilarão na Marquês de Sapucaí apresentam enredos com essa temática. No grupo especial de São Paulo, quatro escolas levarão a temática ao Anhembi: Colorado do Brás, Barroca Zona Sul, Mocidade Alegre e Gaviões da Fiel. Esta última apresentará um enredo afro pela primeira vez. Além disso, os Acadêmicos do Tucuruvi trarão neste ano um enredo sobre a repatriação do manto tupinambá datado do século 16 que chegou ao Museu Nacional em 2024.

“As escolas de samba têm não só o papel, mas um poder de linguagem que possibilita o acesso à nossa própria história, à história dos ancestrais africanos e afro-brasileiros”, afirma Cláudia Alexandre.

 

O carnavalesco Rodrigo Meiners (à esquerda), a pesquisadora Cláudia Alexandre (centro) e a presidente da Peróla Negra Sheila Mônaco (à direita) em frente a um dos carros alegóricos, no pavilhão da escola
O carnavalesco Rodrigo Meiners (à esquerda), a pesquisadora Cláudia Alexandre (centro) e a presidente da Peróla Negra Sheila Mônaco (à direita) em frente a um dos carros alegóricos, no pavilhão da escola – Foto: Cedida pela pesquisadora

 

No fim de semana pré-Carnaval, a pesquisadora desfilou pela Pérola Negra junto ao segundo carro alegórico, que trazia figuras da representação feminina de Exu, como são concebidas e cultuadas na África. “Foi uma dinâmica ancestral que o carnavalesco da Pérola Negra fez, talvez, sem perceber; uma conexão com a minha própria vivência com o samba, com as tradições de matriz africana, com a pesquisa e a escrita. Também tive uma grata surpresa ao saber que a escola de samba Paraíso do Tuiuti está com uma figura que denominaram Exu-Mulher. E isso é muito bonito. Estamos falando de muitos e muitos séculos de tradições”, opina. 

 

*Estagiária sob supervisão de Antônio Carlos Quinto e Silvana Salles

Por jornal.usp

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