Pesquisa sobre doença de Chagas é retomada após liberação de recursos dos EUA – Jornal da USP

Projeto liderado pela professora Ester Sabino, da USP, estava suspenso por bloqueio nos pagamentos dos Institutos Nacionais de Saúde (NIH) dos Estados Unidos
Por Herton Escobar

Um projeto de pesquisa brasileiro sobre doença de Chagas que estava paralisado por ações do governo de Donald Trump nos Estados Unidos foi retomado após a liberação de pagamentos que estavam retidos por determinação do governo federal americano.
O projeto SaMI-Trop é liderado pela professora Ester Sabino, da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), e financiado pelos Institutos Nacionais de Saúde (NIH, em inglês) dos Estados Unidos, dentro de um programa voltado para o estudo de doenças tropicais negligenciadas. O objetivo é desenvolver novas tecnologias para o diagnóstico e o tratamento da doença de Chagas, que é causada pelo parasita Trypanosoma cruzi e afeta cerca de 7 milhões de pessoas no mundo (a maioria delas, na América Latina).

Sabino contou ao Jornal da USP no início de fevereiro que o pagamento das despesas do projeto referentes ao mês de janeiro havia sido negado pelo NIH, e que a liberação dos recursos dependeria de uma análise do Escritório de Administração e Orçamento (OMB) do governo americano. A negativa se deu em meio a uma série de restrições à atividade científica anunciadas pelo governo Trump logo no início de sua gestão, incluindo congelamento de recursos, suspensão de programas, retirada de dados da internet, demissões em massa e até a proibição de realização de reuniões para análise de projetos e a divulgação de comunicados.
Sem saber por quanto tempo os recursos ficariam retidos, ou mesmo se o projeto continuaria a ser financiado, Sabino suspendeu os trabalhos preventivamente. “Como é que eu vou continuar o estudo sem saber se vou ter dinheiro para pagar as contas?”, ponderou a pesquisadora, em reportagem publicada pelo Jornal da USP em 12 de fevereiro.
Dois dias depois, Sabino viu notícias na imprensa americana de que várias ações do governo Trump estavam sendo contestadas na Justiça americana, e que um juiz havia desbloqueado os recursos para pesquisa do NIH. Então, resolveu submeter uma nova ordem de pagamento, no valor de US$ 50 mil, referente a despesas do projeto no mês de janeiro e fevereiro. Quatro dias depois, o pagamento foi feito e os trabalhos do projeto foram retomados. “Estamos nos arriscando um pouco, mas voltamos a trabalhar”, diz a pesquisadora.
Sabino diz que até agora não recebeu nenhuma comunicação do NIH e que não sabe dizer exatamente o que está acontecendo nem como as coisas vão funcionar daqui para frente. Mais de mil funcionários do NIH foram demitidos, várias atividades ainda estão paralisadas e a agência — maior referência em pesquisas biomédicas do mundo — está sob forte pressão para se enquadrar às novas políticas do governo Trump.
O projeto SaMI-Trop foi aprovado numa chamada internacional do NIH em 2022, com duração de cinco anos e um orçamento previsto de US$ 400 mil por ano. A preocupação, agora, é com o que pode acontecer em março, quando o projeto passará por um processo anual de renovação do contrato de financiamento com a agência americana — sujeito a revisões nos valores previstos, de acordo com a situação orçamentária e prioridades do NIH. “Estou um pouco aliviada, de não ter mais uma situação urgente para resolver, mas ainda apreensiva se teremos condições de continuar com o projeto ou não”, afirma Sabino.